Sobre ir


Essa semana esqueci a chave do apartamento e outras coisas mais. Algumas por ser esquecida mesmo, e outras propositalmente. E falando em esquecer coisas propositais e despropositais, arrumar meu novo lar foi um misto de nostalgia e euforia. Confesso que a parte mais dolorosa foi ter de juntar tudo e colocar nas caixas, de onde costumava ser meu antigo quarto na casa dos meus pais. Tinha que levar somente o necessário, mas, parte de mim queria estar ali, fazer parte daquele cômodo que conviveu comigo por anos. Mas a outra parte havia decidido que eu tinha que ir. Viver o novo, e abandonar o que já não seria mais útil para a nova vida que me aguardava. E deixar pra trás coisas nas quais eu era apegada, mas já não usufruía a muito tempo, foi uma tarefa um pouco difícil. Mas eu tinha uma escolha, deixar meu novo lar entulhado das coisas velhas ou viver o novo sem os farrapos do meu passado.  Com uma "dorzinha" no coração, fui me desfazendo de alguns objetos, e colocando na caixa os itens necessários. Dentre as coisas a serem deixadas, havia um sapato velho que eu gostava muito, porém sempre que eu usava causava dores nos meus pés. Por que diabos eu queria tanto um sapato que me machucava? Pelo conforto que me causara antes das dores. Era um lindo sapato, mas me machucava, e preferi deixar em casa para que a minha mãe desse destino a alguém que precisasse. E assim, numa tarde qualquer de arrumação, fui aprendendo que algumas renúncias por mais doloridas que sejam, são necessárias. Principalmente por ter um coleção de coisas de valores emocionais. Do riso ao choro, tudo vira poesia pra mim. E ao abandonar alguns objetos, vi o quanto era desnecessário o meu saudosismo. O quão era inútil querer guardar coisas para mim nas quais não haviam uso, na esperança de que um dia fossem caber em mim. Só estava inutilmente levando cargas em minhas costas, com entulhos que nada haviam à acrescentar. Na vida, as vezes faz-se necessário abrir mão de coisas que já não fazem parte de quem somos. Coisas que só apertam e fazem calos nos pés, como o sapato. Do que adianta guardar de lembrança? Viver com um pé no presente e outro no passado não é seguir em frente. Saudade é inevitável, mas é indo em busca de viver o que vida tem pela frente que a gente entende que, nenhum problema é insuperável. Que é melhor está sem os sapatos, do que tentar encaixar seus pés onde já não lhe cabe, onde só te machuca e te deixa com bolhas. Merecemos sapatos novos e confortáveis para percorrer novos caminhos. Novas histórias para colecionar. Risos para sorrir, e vez ou outra, choro para lavar a alma.  Precisamos recarregar nossas energias todos os dias para prosseguir, depositando fé em Deus, porque ele não costuma falhar na missão de nos livrar dos maus caminhos. Precisamos de novas folhas e uma caneta - com muita tinta, de preferência - para escrever novos capítulos. Esquecendo propositalmente algumas dores para abrir espaço para os sentimentos de paz. Isso é sobre coisas, lugares, sentimentos, e pessoas... é sobre aprender a ir.

- Ingrid Ramires

1 comentários

  1. Ai esse texto, o final então <3
    Tão bonito e sincero, adorei!
    Beijos
    www.somosvisiveiseinfinitos.com.br

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